Será que é amor?

Opinião

Amanda Cantú

Amanda Cantú

Jornalista

Colunista do caderno Você

Será que é amor?

Por

Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Durante a semana, vimos na mídia local uma fotografia que chamou muito a atenção. Na cena, uma mulher beija o ex namorado em um tribunal. Ele está sendo julgado por ter, em agosto de 2019, atirado algumas vezes contra ela. Mas ela diz que ele já pagou pelo seu erro e que o perdoa.

A cena teve repercussão nacional. Centenas de interações com as postagens nas redes sociais. Diferentes versões da história que levou à tal cena. Discussões sobre ela ter agido certo ou errado. Debates sobre a atitude da vítima e seu papel como vítima. Muitas pessoas refletindo e escrevendo sobre o tema. E, claro, os mesmos comentários de sempre. “Ela só quer mídia”. “Até que a morte os separe”. Além de outros bem mais cruéis, muitas vezes vindos de mulheres.

Não quero ser mais um juiz no caso, muito menos que este espaço se torne tribunal. Quero usar a situação para pensarmos um tema muito importante: a dependência afetiva. Ela é a razão de muitas pessoas – como talvez seja o caso da moça da história – viverem relacionamentos abusivos. Esta dependência muitas vezes começa ainda na infância, quando aprendemos a confundir posse com cuidado, agressão com amor. Quando crescemos, somos ensinados que o ciúmes é o “tempero” da relação, que é uma forma de demonstrar preocupação e zelo. E talvez a pior de todas: que “o amor tudo suporta e tudo perdoa”.

Crescer em uma sociedade que ainda difunde esta falsa ideia de amor romântico facilita relacionamentos doentes e a manipulação psicológica dentro deles. Nem tudo começa ou termina com cinco tiros. Começa com pequenos comentários sobre a sua roupa, suas companhias ou seu comportamento. Começa lhe fazendo acreditar que você está exagerando. Até lhe fazer acreditar que não existe nada melhor fora deste relacionamento, e o pior, lhe faz acreditar que isso é amor. E amor perdoa, não é mesmo?

A dependência afetiva é só um dos fatores que nos prende a relacionamentos falidos. Precisaria de muito mais espaço aqui para citar todos os eles, e ainda quero falar sobre mais um ponto que me chamou atenção no caso: a empatia feminina.

Relutei em ler os comentários das postagens sobre o caso pois sabia que isso me revoltaria. Quando são mulheres julgando outra mulher, não só me revolta, me entristece. Em algum lugar li que a jovem “enfraquece a luta feminista”. Talvez ela realmente o faça. Mas a luta feminista não é justamente sobre isso? Suporte àquelas que precisam? Também li a seguinte frase “Que essa moça saiba que nós não vamos desistir dela e que, infelizmente, na certeza de um novo fato parecido, nós seguiremos aqui para convencê-la novamente que ela merece muito mais do que isso. Sinto que perdemos por pouco”. Não conheço a autora, mas me deu esperança. Obrigada.

O caso desta e de outras jovens é bem mais complexo do que a maioria dos especialista em juri de internet compreende. Lidar com situações como essa exige respeito, delicadeza e empatia, porque, como escreveu Carpinejar, “devoção, isolada do mundo, pode virar cativeiro”.

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